A ida ou não do Brasil ao Fundo Monetário Internacional deve ser encarada fundamentalmente sem emoções. Se tivermos que ir, devermos fazê-lo com a maior serenidade. Porém, quando o próprio governo brasileiro já definiu a sua posição, em principio, contrária de que o País recorra ao FMI, creio que compete aos seus executivos da área econômica encontrar a maneira de evitar que este fato ocorra. É claro que uma ida ao FMI não representa o “fim do mundo” para o País, porém, é evidente que, se isto puder ser evitado será preferível. É errado pensar que se recorrêssemos ao FMI, teríamos assegurado crédito fácil com os banqueiros internacionais. O fundo funcionaria como avalista para a comunidade financeira internacional, ao mesmo tempo, que ao supervisionar nossa política econômica, exerceria sobre nossas contas uma severa auditoria. Assim, se este auto-constituído auditor, considerasse que nossa política econômica estivesse se distanciando de sua orientação, o aval deixaria de existir automaticamente.
É importante lembrar que os atuais desequilíbrios externos são oriundos fundamentalmente do “choque do petróleo”, o qual gera, de um lado, enormes superávits de petrodólares nas mãos dos países da OPEP e, de outro, déficits gigantescos e crescente endividamento dos países importadores de petróleo, como o Brasil. O FMI foi criado em um contexto histórico totalmente diferente e não tem condições financeiras nem políticas de assumir o papel de reciclar os petrodólares que o próprio sistema bancário internacional se mostra relutante em realizar. Assim, o problema do desequilíbrio externo não é exclusivamente brasileiro e, como tal, sua solução envolve a reestruturação do sistema financeiro internacional, no sentido de orientá-lo para financiar programas energéticos de substituição do petróleo.
Além disso, países desenvolvidos, que já recorreram a empréstimos do FMI, o fizeram, entre outras razões, para legitimar a tomada de decisões internas, muito difíceis de serem sustentadas politicamente. E esta está longe de ser a situação brasileira.
Embora o FMI seja hoje mais flexível em suas orientações e exigências sobre a condução da política econômica do que já foi no passado, é certo, que mesmo assim, muitas exigências trariam dificuldades com conseqüências sociais imprevisíveis para um país em desenvolvimento com as características do Brasil.
Por esta análise, começamos a ver, claramente, que não há nenhuma vantagem em se recorrer ao FMI. Creio, com grande convicção, que ainda poderemos resolver nosso problema de recursos externos por nós mesmos, sem a necessidade de um avalista e sem termos que aceitar um auditor externo desse porte.
De que forma? Deveríamos elaborar um programa de médio e longo prazo realista e perfeitamente exeqüível, com o objetivo de resolver os problemas estruturais, causadores dos graves desequilíbrios internos e externos. Este programa teria que se apoiar numa política de curto prazo, global e consistente, que o viabilizasse. Mais ainda, teria que visar um imediato equilíbrio da nossa balança comercial, através de estímulos às exportações e, principalmente, de contenção das importações mediante um controle seletivo previamente estabelecido. Desta forma, o nosso déficit nas transações correntes ficaria restrito ao desequilíbrio da balança de serviços, como um primeiro passo.
Este programa deveria apontar para um crescimento que fosse compatível com as nossas necessidades, mas também com as nossas possibilidades, o que imagino, seria alguma coisa ao redor de 5% ao ano. Deveria, igualmente, mostrar de que forma o governo iria equilibrar o seu orçamento fiscal e de que maneira iria financiar os investimentos necessários na área de substituição de energia, agricultura e programas voltados para a exportação.
Tal plano deveria demonstrar, explicitamente, qual seria o conteúdo de nossa política cambial, monetária e salarial. A taxa cambial deveria ser realista e reajustada de acordo com a fórmula convencional e tradicionalmente aceita. A política monetária teria de ser firme na concessão de crédito, além de dever englobar um programa gradual de extinção de subsídios. A política salarial deveria ser austera, mas sem punir o assalariado.
Creio firmemente que o Brasil é um país perfeitamente administrável, viável e com enorme potencial. Desta forma, não temos nada a esconder e muito menos do que nos envergonhar. Temos que mostrar ao mundo que precisamos apenas de tempo e trabalho sério para que possamos superar as dificuldades momentâneas, que, aliás, não são particulares apenas ao Brasil. Estou convicto que através de um programa de “full disclosure”, realista e bem estruturado, restabeleceremos a confiança abalada e conseguiremos o apoio internacional. A meu ver, ainda é tempo de mudar o rumo dos acontecimentos. É muito cedo para abdicarmos da gestão da nossa economia, recorrendo ao Fundo Monetário Internacional.