As esperanças de uma reativação do nível de atividade econômica e de uma contínua queda na taxa de inflação – que era predominante no final do ano passado – foram seriamente abaladas nos últimos dois meses à medida que tomamos conhecimento dos principais indicadores econômicos. Uma expectativa menos otimista começa a tomar lugar e a economia brasileira acabou entrando em compasso de espera diante do quadro de incertezas e indefinições a respeito do seu futuro.
Contribuíram para a criação deste clima os resultados desfavoráveis no combate à inflação e o desempenho decepcionante das exportações brasileiras nos últimos dois meses. Os indicadores convencionais de nível de atividade econômica também não mostram nenhum sinal evidente de recuperação. A produção industrial manteve a sua tendência de queda em janeiro e a taxa de desemprego também aumentou em quase todas as regiões metropolitanas do País. Os indicadores mais recentes da FIESP mostram para o setor industrial, uma tendência à estabilização no nível de emprego, mas nenhuma recuperação.
Mais preocupante no momento do que a ausência de indicadores econômicos favoráveis é a ausência de perspectivas e a crescente apreensão que vem se alastrando no meio empresarial. De fato, os fatores imediatos que levaram a economia brasileira em 1981 para a sua mais profunda recessão persistem neste inicio de ano. Corremos assim o risco de repetirmos um desempenho econômico tão negativo quanto o de 1981 com o agravante de que a condição sócio-econômica do País está muito mais debilitada este ano.
As elevadas taxas de juros, tanto no âmbito interno como no mercado internacional, não dão sinais de queda. Internamente, as autoridades monetárias têm sido obrigadas a se utilizar do “open” até a sua saturação para evitar um descontrole monetário, pressionando evidentemente as taxas de juros. O mais apreensivo é que as causas primárias da expansão monetária (subsídios creditícios, déficit das estatais, etc.) continuam atuando sem nenhuma perspectiva de controle, o que não nos permite vislumbrar quando as autoridades monetárias deixarão de pressionar as taxas de juros no “open”. As elevadas taxas de inflação nos dois primeiros meses acabaram revertendo as expectativas de queda, e deverão provocar um aumento na correção monetária e cambial com reflexos previsíveis sobre a taxa de juros. Com os juros reais nos atuais níveis, a retomada dos investimentos privados e do consumo de bens duráveis se torna cada vez mais remota.
O enorme déficit do setor público ainda exige o controle de seu dispêndio, assim como exige a transferência de recursos provenientes do setor privado, via elevação da carga tributária e captação de poupança financeira, o que também afeta negativamente a atividade do setor privado.
As dificuldades do setor externo também persistem em 1982 e a obtenção de superávit comercial considerável neste ano depende muito mais do controle das importações, pois as exportações estão encontrando dificuldades de expandir de acordo com as metas oficiais. Além disso, não seria exagero retórico afirmar que a política econômica brasileira, no ultimo ano e meio, está sendo conduzida pela situação de desequilíbrio cambial e pela dívida externa. Ninguém hoje duvida que a decisão de praticar uma política nitidamente recessiva em 1981 foi determinada pela possibilidade de eclosão de uma crise cambial no início do ano passado. Como resultado desta mudança, experimentamos a pior crise econômica desde a segunda guerra mundial. Com isso, o Brasil deu mostras de ser capaz de alterar o curso de sua política econômica, quando as condições externas assim o exigiram.
O que importa discutir no momento é se o País já não ganhou algum espaço de manobra para evitar em 1982, o que ocorreu no ano passado. Em outras palavras, teremos que suportar a perspectiva de um desempenho tão negativo de crescimento econômico no corrente ano, ou é possível pensar em recuperação da economia?
É imperioso que se procure resolver os problemas econômicos com o menor custo social possível. Em 1981 muitos trabalhadores perderam os seus empregos e estão sem perspectivas de recuperá-los; a classe media está assustada e o poder de compra de seus salários diminui continuamente; as pequenas e medias empresas estão sufocadas pela queda das vendas e pelos altos juros, correndo o risco de caminharem para a insolvência; as grandes empresas também sufocadas pelas quedas nas vendas e pelos altos juros estão esgotando suas reservas; os agricultores que tiveram que arcar pesadamente com o ônus da política antiinflacionária estão descapitalizados e desanimados.
Não podemos mais neste momento delicado assumir uma atitude de passividade e o atual imobilismo da política econômica deve ser rompido. Além disso, a recessão é remédio de risco e o nosso país não tem condições de suportá-lo por dois anos consecutivos. Mesmo que cresçamos cerca de 4% em 1982 apenas conseguiremos voltar ao patamar de 1980. Paralelamente, acredito que a violenta desaceleração do setor industrial e a imensa capacidade ociosa, podem ter efeitos perversos sobre a própria balança comercial, pois os preços dos produtos manufaturados exportados podem ser afetados pela elevação do custo fixo unitário ditado pela diminuição de vendas ao mercado interno.
Não se pede que o governo abandone aquilo que esta fazendo corretamente, nem que abandone a política antiinflacionária e de ajuste no balanço de pagamentos. Mas na condução da política econômica é imperiosa uma maior sensibilidade para os enormes custos sociais e os problemas que já afligem todos os segmentos da sociedade brasileira.
É preciso que os empresários, individualmente ou através de entidades de classe, debatam as propostas e encaminhem as melhores soluções para sairmos deste impasse, e neste debate não devemos esquecer de que a verdadeira recuperação da economia brasileira passa necessariamente, em curto prazo, pela redução na taxa de juros; em médio prazo, por uma reforma fiscal e orçamentária que permita, na fase de recuperação da economia, eliminar o déficit do setor público como um todo, incluindo as estatais, e, em longo prazo, por mudanças mais profundas na estrutura produtiva nacional, ajustando-a a nova estrutura de preços relativos gerados pela crise do petróleo.
Hoje, sem duvidas, a taxa de juros consiste em um dos elos críticos e a sua redução é o primeiro passo para caminharmos para a recuperação e para a remoção dos demais obstáculos. A recente proposta feita pela FIESP de vinculação dos empréstimos do crédito é perfeitamente exeqüível e capaz de baixar a taxa de juros, sem perder o controle sobre a política monetária. A adoção desta medida seria também um primeiro passo a romper o atual imobilismo e acabar com as apreensões e com isso retomar o controle sobre a política econômica, reorientando no sentido de atender as necessidades reais de crescimento da economia brasileira.